24.1.06

Crises e serotonina.

Crise
1 Momento crítico ou decisivo. 2 Situação aflitiva. 3 Conjuntura perigosa, situação anormal e grave. 4 Momento grave, decisivo.
Serotonina:
A Serotonina é uma substância chamada de neurotransmissor existe naturalmente em nosso cérebro e, como tal, serve para conduzir a transmissão de uma célula nervosa (neurônio) para outra. Está intimamente relacionada aos transtornos do humor, ou transtornos afetivos.
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Que fique bem claro que na adolescência todos os problemas do mundo são apenas hormonais. E lógico que nunca mais tristezas pequenas serão tão grandes. Mas nada que uma boa dose de chocolate não resolva.

18.1.06

Flores e sorrisos

Raphaella acordou bonita.
Desprezou os espelhos, esqueceu qualquer dúvida, respirou fundo e fechou bem os olhos. Aí tudo se encheu de felicidade, foi como se o mundo começasse a se embelezar aos poucos, reflexo da beleza recém descoberta (e temos que concordar que as novidades carregam graça própria).
Sentou na cama, sorriu e começou a lembrar. Nas imagens que passavam pela sua cabeça, como num filme, ela continuava linda: o rosto iluminado, os cachos caindo nos ombros, os olhos brilhando. Como será que nunca tinha percebido? Quanto tempo havia perdido sendo feia e despediçando tanta graça?
Foi então que começou a subir, flutuar pelo quarto. Acordou sobressaltada com uma pancada na cabeça. Tinha batido no teto e quase sentiu medo. Mas quando viu a janela aberta, resolveu se arriscar, o medo ficou lá embaixo, distante. E foi voando, voando, voando.
De Raphaella eu nunca mais soube, mas dizem por aí que nasceram margaridas em cada janela da cidade e nasceram também sorrisos nos rostos mais desavisados. Tanta beleza pra sorrisos e flores?

10.1.06

Negros como a noite.

A menina nasceu com os olhos negros como a noite. Antes de parecer com o pai ou com a mãe, parecia com a noite.
Era impossível não perceber, porque ao nascer trouxe também o seu primeiro contraste: a pele, de tão branca, acabava por tornar os olhos ainda mais pretos. A avó logo estranhou, a tia achou excêntrico e a mãe, como tinha que ser, achou lindo.
Com o tempo, o olhar também enegreceu e a menina anoiteceu. A calmaria das madrugadas e a solidão do sereno passaram a fazer parte dela. Mas começou também a carregar o brilho das estrelas e o gosto dos sonhos dentro do sorriso. E é somente isso que importa.

1.1.06

Centro do mundo

Nenhuma outra cidade tem um centro comercial como o de Recife.
Ruas estreitas, sempre formigando de gente. Lá, todos os sentidos se misturam e passear pelo mercado São José, pela rua da Imperatriz, pela rua Velha ou da Palma acaba se transformando numa espécie de transe, embalado pelos cheiros das ervas -que queimam sem parar naqueles incenssários de barro- e pelo calor dos encontrões inevitáveis. Em nenhum outro lugar se encontra santos católicos e orixás numa mesma barraquinha, a erva que "cura chulé, mal olhado, indigestão e artrite", a bijuteria da novela e tudo por noventa e nove centavos.
Mas o tempero mais forte daquelas ruelas do século passado são as pessoas, que parecem ter saído de quadros, fotografias, romances, filmes... de qualquer lugar, menos da realidade nossa de cada dia. Pessoas sem dentes, com chapéus antigos e roupas coloridas, sempre espiando do alto de toda a sabedoria, com seus olhos grandes e brancos. Sempre simpáticas e sorridentes, seja para vender, seja para passar o tempo ou só para lembrar. E lembranças é o que não falta por lá. Retratos de uma época que já passou e co-existe na simpatia e sorrisos dessa gente.
Hoje tudo estava diferente. Não tinha gente, não tinha tônicos milagrosos para vender. Deserto, absolutamente deserto. Os casarões antigos, hoje solitários, tornaram-se decadentes em sua imensidão. As ruas estreitas e de pedras, tornaram-se esburacadas e sem graça.
Quase pensei que ali não era o centro do mundo, foi então que lembrei que segundas-feiras sempre existirão...