15.3.06
Globalização.
Jantar fora sempre foi dos prazeres mais torturantes para mim, o melhor exemplo da angústia sartriana diante das escolhas descartadas. Eu adoro comer e nunca sei ao certo o que quero, tantas possibilidades me deixam desesperada, chego até a sentir saudade do feijão com arroz ou sopa de todo dia.
Hoje foi especialmente difícil. Fui jantar com a minha mãe num barzinho da moda no centro da cidade. Surpresa grande tive ao ver que o cardápio passeava do yakissoba, popular macarrão chinês, até o babangush, obscuro sanduíche árabe, passando, como não poderia deixar de ser, pelo bom e velho arrumadinho pernambucano. A minha mãe, mulher forte e decididade que é, logo escolheu e o garçon começou a olhar para mim. E a olhar, a olhar... Depois de alguns minutos de silêncio tenso, disse que ia escolher depois. Juro que quase decorei aquele cardápio tentando decidir o que ia comer. Acabei me decidindo pela opção mais comum e não-original: uma empada de frango, faz favor, e com muito ketchup.
Quando a comida chegou comecei a pensar como essa coisa de viver numa aldeia global dificulta as coisas. A minha mãe comeu um falafael, sanduíche indiano de pão sírio com broto de feijão, e de sobremesa comeu um fluden, doce judaíco. Eu, criança sem criatividade que sou, acabei devorando um waffle muitíssimo american way of life e uma empadinha muito sem graça, tudo isso ao som do brasileiríssimo Caetano Veloso, cantando em inglês, claro. Se isso não é globalização, o que mais pode ser?
Agora, por favor, tirem-me uma dúvida: de onde vêm as empadinhas?
9.3.06
Montanha russa.
Dia desses parei para pensar nos possíveis sintomas de crescimento.
Tudo começou quando, de repente, me flagruei com dezoito anos. Foi assim, da noite pro dia, sem motivo e sem aviso prévio. A surpresa foi tão grande que duvidei, me besliquei, tentei fechar e abrir os olhos.
De certo não adiantou. Depois de dar de cara com o inevitável e perder as esperanças de cura, comecei a tentar descobrir os sintomas. Maioridade. Deve significar muitíssima coisa, desde os dez anos, quando os hormônios da futura adolescência começam a querer se mostrar, se começa a desejar os dezoito anos. Não tem como não ouvir um não dos pais e não pedir intimamente que o tempo passe logo e que a indepedência venha, junto com a tal maioridade. Mas o fato é que, em mim, nenhuma mudança se operou. Foi tudo muito sútil e indesejado.
Cheguei à conclusão, sorrindo intimamente, que não ultrapassei a linha de chegada na fase adulta. Contrariando a tudo e a todos, venho me arrastando pela pista, quase parando. Sorriso sapeca, mimada como aos seis anos, roupas coloridas e cabelos desgrenhados. Continuo perdida no meu mundo imaginário, de princesas e sapos.
Ouvi dia desses, numa conversa de botequeim, que a vida é uma montanha russa, com seus altos e baixos. Isso não muda, para crianças e adultos. A diferença é que quando se é pequeno, montanhas russas são divertidas. As quedas vertiginosas são sempre aliviadas pelos gritos, mal se chega ao chão e já se começa a subir. Crianças nunca vomitam em parques de diversão.
E quer saber? Aposto que consigo gritar mais alto que você e sem vomitar. Até mesmo nos loopings.
A cada dia escrevo menos, ao pensar nos possíveis motivos, acabo me dando conta de que não sei lidar com a vida dando certo devagarzinho. A calmaria me assusta, sou feita de gritos de felicidade e lágrimas, dramas e contradições.
Só sei me fazer barroca, nunca realista, nunca com a contenção dos parnasianos.
Olho no espelho, não me acho, não quero me procurar. Tudo está se esvaziando: as coisas correm para esquerda, para direita, para canto nenhum. Fico no meio, parada, observando, criança assustada.
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